Captação de água de chuva é tão antigo quanto as montanhas

domingo, 23 de janeiro de 2011

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O conceito da tecnologia dos sistemas de captação de água de chuva é tão antigo quanto as montanhas

Palestra proferida durante o 2º Fórum Mundial da Água, em
Haia, Holanda, de 16 a 22 de março de 2000.
João Gnadlinger
Fonte: http://www.irpaa.org/
Eu gostaria de começar definindo o termo colheita de água de chuva. Nós o entendemos e usamos como um termo geral para a maioria dos tipos de captação de água de chuva (com exceção de colheita de inundações), seja para uso na agricultura ou domestico em áreas rurais. Hoje em dia a colheita de água de chuva também é usada em áreas urbanas (Gould). Água de chuva pode ser coletada de telhados, pátios, do chão e das ruas. No presente trabalho vou apresentar alguns aspectos da colheita de água de chuva em áreas rurais. Os termos e conceitos colheita de água de chuva e captação de água de chuva são usados sem distinção.
No seu pronunciamento de abertura na 9ª Conferência Internacional sobre Sistemas de Captação de Água de Chuva, realizado no Brasil em Julho de 1999, o Dr. A. Appan disse:
“As tecnologias de sistemas de captação de água de chuva são tão antigas quanto as montanhas. O senso comum diz – como em todos os projetos de abastecimento de água – armazene a água (em tanques / reservatórios) durante a estação chuvosa para que ela possa ser usada quando mais se precisa dela, que é durante o verão. Em outras palavras: “Guarde-a para o dia da seca!” As tecnologias, os métodos de construção, uso e manutenção estão todos disponíveis. Além disso, o mais importante é que ainda existem muitos modelos financeiros que vêm ao encontro das necessidades de países desenvolvidos e em desenvolvimento. O que mais precisamos é de uma aceitação geral dessas tecnologias e vontade política de pôr em prática estes sistemas.”
Neste trabalho, seguiremos os principais pontos da constatação do Dr. Appan.
A história da colheita de água de chuva.
A colheita de água de chuva tem sido uma técnica popular em muitas partes do mundo, especialmente em regiões áridas e semi-áridas (mais ou menos 30 % da superfície da terra).
Zonas áridas da terra
A colheita de água de chuva foi inventada independentemente em diversas partes do mundo e em diferentes continentes há milhares de anos. Foi usada e difundida especialmente em regiões semi-áridas onde as chuvas ocorrem somente durante poucos meses e em locais diferentes.
Eu gostaria de ilustrar isso com alguns exemplos.

No Planalto de Loess da China (Província Ganzu) já existiam cacimbas e tanques para água de chuva há dois mil anos.
Na Índia, um projeto de pesquisa denominado Sabedoria prestes a desaparecer (Dying Wisdom) enumera muitas experiências tradicionais de colheita de água de chuva nas quinze diferentes zonas ambientais do país.
No Irã encontramos os Abanbars, o tradicional sistema de captação de água de chuva comunitário.
Abanbar, cisterna tradicional usada no Iran
Há 2.000 anos existiu um sistema integrado de manejo de água de chuva e agricultura de escoamentono de água de chuva no deserto de Negev, hoje território de Israel e Jordânia. runoff
Como representante das Américas, gostaria de dizer algumas palavras sobre as práticas pré-colombianas do povo Maya na península de Yucatan, hoje México. O México como um todo é rico em antigas e tradicionais tecnologias de colheita de água de chuva, datadas da época dos Aztecas e Mayas.
Ao sul da cidade de Oxkutzcab ao pé do Monte Puuc ainda hoje podemos ver as realizações dos Mayas. No século X existia ali uma agricultura baseada na colheita de água de chuva. As pessoas viviam nas encostas e sua água potável era fornecida por cisternas com capacidade de 20.000 a 45.000 litros, chamadas Chultuns.
Cisterna do povo Maya, chamada Chultun, capacidade: 45.000 l, diámetro: 5 m, área de captação: 150 m2, a abertura é coberta por uma pedra com um buraco no meio, onde se encaixa um pino de madeira, que se retrai quando chove
Sistema integrado de fornecimento de água do povo Maya em Xpotoit, Yucatan, México
Estas cisternas tinham um diâmetro de aproximadamente 5 metros e eram escavadas no subsolo calcário, revestidas com reboco impermeável. Acima delas havia um área de captação de 100 a 200 m2. Nos vales usavam-se outros sistemas de captação de água de chuva, como Aguadas (reservatórios de água de chuva cavadas artificialmente com capacidade de 10 a 150 milhões de litros) e Aquaditas (pequenos reservatórios artificiais para 100 a 50.000 litros).
É interessante observar que as Aguadas e Aquaditas eram usadas para irrigar árvores frutíferas e/ou bosques além de fornecer água para o plantio de verduras e milho em pequenas áreas. Muita água era armazenada, garantindo-a até durante períodos de seca inesperados. Isto é um exemplo de manejo integrado de água. Exemplos como este e muitos outros podemos encontrar ao redor do mundo.
Por que os sistemas de colheita de água de chuva caíram fora de uso no mundo?
Na península de Yucatan, o desaparecimento do uso de colheita de água de chuva aconteceu em parte pelas lutas entre os diversos povos indígenas, mas principalmente pela invasão espanhola no século XVI. Os colonizadores espanhóis introduziram um outro sistema de agricultura, vários novos animais domésticos, plantas e métodos de construção europeus. Estes não eram adaptados à realidade cultural e ambiental de Yucatan.
Na Índia, razões semelhantes causaram o desaparecimento da colheita de água de chuva. O sistema colonial britânico só se interessava por tributos, forçando portanto as pessoas a abandonarem o sistema de colheita de água comunitário dos vilarejos e causando assim o colapso de um sistema centenário.
O progresso técnico do século XIX e XX ocorreu principalmente nos assim chamados países desenvolvidos, em zonas climáticas moderadas e mais úmidas, sem necessidade de captação de água de chuva. Como conseqüência da colonização, praticas de agricultura de zonas climáticas moderadas foram implantadas em zonas climáticas mais secas. Além disso houve uma ênfase na construção de grandes barragens, no desenvolvimento do aproveitamento de águas subterrâneas, e em projetos de irrigação encanada com altos índices de uso de energia fóssil e elétrica; estas são algumas razões porque as tecnologias de colheita de água de chuva foram postas de lado ou completamente esquecidas.
Agora, porém, no início do século XXI a situação é bem diferente:
Em muitas regiões semi-áridas do mundo, o crescimento populacional exerce pressão sobre o abastecimento de água para consumo humano, para os animais e para a agricultura.
Projetos de agricultura e água baseados em alto consumo de energia e tecnologias sofisticadas se mostram cada vez menos sustentáveis.
Ao mesmo tempo, tecnologias re-descobertas ou novas e/ou materiais modernos, tem permitido uma nova abordagem na construção de tanques de armazenamento e áreas de captação.
Tudo isso levou a uma nova expansão dos sistemas de captação de água de chuva, tanto em regiões onde já eram usados anteriormente, como em áreas onde até então eram desconhecidos.
Alguns exemplos ilustrarão este ponto:
No Planalto de Loess do Norte e Noroeste da China, onde as precipitações são baixas e as águas subterrâneas são escassas, as pessoas têm feito muitas experiências com a colheita de água de chuva. A agricultura nesta região depende principalmente da chuva como fonte de água. Nos últimos anos, o governo local da província de Gansu colocou em prática o projeto de captação de água de chuva denominado “121″: o governo auxiliou cada família a construir uma (1) area de captação de água, dois (2) tanques de armazenamento de água e um (1) lote para plantação de culturas comercializáveis. O projeto solucionou o problema de água potável para 1,3 milhão de pessoas (260.000 famílias) e seus 1,18 milhão de cabeças de animais. Desde 1997, o projeto de captação de água de chuva e irrigação tem tido continuidade, almejando fornecer água para uma irrigação suplementar com um método altamente eficiente de economia de água. A água de chuva é captada nos pátios  ou em áreas inclinadas guarnecidas com lajes de concreto e armazenada em tanques subterrâneos. É fácil criar a pressão d’água necessária para irrigação por mangueiras ou gotejamento nesta região. Culturas comercializáveis como verduras, ervas medicinais, flores e árvores frutíferas foram plantadas, como também viveiros. Pequenos agricultores da região montanhosa do norte da comarca de Yuzhong se mostram entusiasmados com as verduras plantadas em suas próprias estufas e irrigadas com a água de chuva armazenada nos tanques. É a primeira vez na história que estufas são construídas em uma região a 2.300 m acima do nível do mar e com apenas 300 mm de precipitação anual, para plantar verduras como pimentão, berinjela, tomate e abóbora. A captação de água de chuva tem se tornado uma medida estratégica para o desenvolvimento social e econômico desta região semi-árida.
Projeto de colheita de água de chuva denominado "121" no Norte da China
Projeto de colheita de água de chuva "121", vista parcial
Na região semi-árida do Brasil, a agricultura foi introduzida somente em um passado recente. A população local não teve oportunidade de fazer experiências com métodos de colheita de água de chuva e menos ainda de aprender a viver e trabalhar em um clima semi-árido. Porém, principalmente devido ao crescimento populacional e à degradação do meio-ambiente, as pessoas agora têm que aprender a viver nesta região rural semi-árida, que se estende sobre 900.000 km2. Uma fonte confiável de água de superfície existe só para uma pequena área às margens do rio São Francisco e as águas subterrâneas no subsolo predominantemente cristalino são escassas e salobras. Por isso a água de chuva é a fonte mais confiável de água para uso humano e animal.
Das experiências do passado e em outras regiões semi-áridas aprendemos, que a sustentabilidade de sistemas de colheita de água é baseada na combinação entre as necessidades básicas dos agricultores, as condições naturais locais e as condições políticas e econômicas predominantes da região.
As pessoas aprendem a viver em uma região semi-árida criando uma nova cultura de convívio com o meio-ambiente e com a água. Esta nova relação com o ambiente e a água tem sido encorajada particularmente pelas muitas organizações de base na região. Por outro lado, ainda estão sendo implantados grandes projetos de irrigação ao longo do rio São Francisco. Grandes companhias estão planejando irrigar extensas áreas para produzir culturas para exportação.
Três tópicos principais foram elaborados visando garantir a sustentabilidade da vida do povo do Nordeste Brasileiro:
- Clima e manejo de água: Como funciona o clima semi-árido e quais as conseqüências que tem para a agricultura? Estabelecer medidas preventivas, como colheita de água de chuva, para dispor de reserva nos períodos secos.
- Criação de animais: Provisões necessárias para a criação de pequenos animais, especialmente ovinos e caprinos, adaptados ao clima semi-árido, através de armazenamento de água e forragens para os meses secos, vermifugação, etc.
- Agricultura baseada em captação de água: Captar a água de escoamento para garantir a colheita mesmo em anos com pouca precipitação; plantar espécies adaptadas à seca, como sorgo; plantar árvores bem resistentes ao clima semi-árido, como o nativo umbuzeiro (Spondias tuberosa).
Em colaboração com a população rural, o problema da água deve ser gerenciado de três maneiras, usando todas as fontes de água disponíveis (subterrânea, de superfície, de chuva). É necessário ter:
a- água potável para cada família (fornecida por cisternas, poços rasos, etc.);
b- água comunitária para lavar, tomar banho e para os animais (fornecida por açudes, caxios (cisternas na rocha de mica com captação do solo), cacimbas de areia (cisternas no leito arenoso dos rios), poços rasos, etc.);
c- água para a agricultura (fornecida por barragens subterrâneas, irrigação de salvação, captação de estradas para plantio de árvores frutíferas, uso de sulcos para o armazenamento de água de chuva in situ = colheita de água entre fileiras);
d- água de emergência para anos de seca (fornecida por poços profundos e barragens menores estrategicamente posicionadas). Este ponto representa uma solução transitória enquanto os pontos a – c ainda não estiverem totalmente implantados.
Os diferentes tipos de captação de água de chuva usados no Nordeste Brasileiro são:
Até agora, entre os tipos diferentes de cisternas usadas para resolver o problema da água potável em áreas rurais do Nordeste, a cisterna de placa de concreto com tela de arame (com 50 cm de largura, 60 cm de comprimento e 3 cm de espessura), fortificada com arame galvanizado de aço Nº 12 e rebocada por dentro e por fora foi a cisterna mais construída. A aderência entre as placas de concreto às vezes é fraca, por isso, a tensão pode causar rachaduras, por onde a água pode vazar.
Por esta razão, a cisterna de concreto com tela de arame (que utiliza uma fôrma durante a primeira fase de construção) provavelmente vai ser o tipo mais usado e apropriado para a região. Uma cisterna desse tipo raramente vaza, e se isso acontecer, poderá ser facilmente consertada. É igualmente adequada também para pequenos e grandes programas de construção de cisternas.
Cisterna de concreto com tela de arame para 10.000 litros
Parafusando a forma de folha de aço
Forma de folha de aço envolvida com tela de arame e arame galvanizado
Aplicação da primeira camada de argamassa cobrindo o arame
Uma cisterna subterrânea feita com massa de cal e tijolos relembra os Abanbars do Irã e os Chultuns do México.
Cisterna subterrânea de massa cal e tijolos
Corte transversal de uma cisterna de massa de cal e tijolos (10 000 l)
Início da construção de uma cisterna de massa de cal e tijolos
Cobrindo a cisterna com uma cúpula de blocos
Em algumas partes da região semi-árida assistimos ao renascimento de caxios, cisternas cavadas manualmente na rocha; trata-se de uma maneira tradicional de captar a água de chuva. Sua água é geralmente usada para os animais, porém, depois de filtrada, pode ser usada também para consumo humano.

Caxio, cisterna cavada manualmente na rocha
As barragens subterrâneas armazenam a água de escoamento para uso posterior: a parede da barragem é cavada para baixo da superfície do chão em solo raso, em direção ao subsolo cristalino impermeável. Em seguida, uma barreira de terra ou pedras é construída e coberta com uma folha de PVC do lado de onde vem a água para evitar vazamentos. No solo encharcado com água pode-se plantar culturas anuais ou árvores frutíferas. Além disso pode-se colocar quase sempre uma cisterna subterrânea para poder usar a água para consumo humano ou animal ou para irrigação. Ainda nos primeiros meses da estação seca é possível plantar uma segunda vez e até mesmo nos anos de maior seca estas barragens nunca ficam sem água.
Barragem subterrânea
Barragem subterrânea, colocação da folha de PVC
As assim chamadas represas / barreiros de salvação ou irrigação suplementar captam água de escoamento de uma grande área natural de captação superficial. Abaixo da represa, as pessoas plantam culturas anuais como feijão, milho ou sorgo. Se há um período seco durante a estação chuvosa, eles podem regar as plantações por gravidade com a água da represa. Se não precisarem da água, poderão plantar novamente durante a estação seca e usa-la para irrigar uma segunda plantação.

Barreiro de salvação
A captação in sito entre fileiras aplica-se por exemplo no sulcamento da roça antes ou depois da semeadura, na aração parcial ou nos sulcos com barramento de água. Captação de água de chuva in situ é apropriado para sistemas de plantação existentes e pode ser executada com a ajuda de máquinas ou animais.

Aração de sulcos barrados
A tecnologia dos sistemas de colheita de água de chuva é conhecida, mas “o que mais precisamos é de uma aceitação geral dessas tecnologias e vontade política de por em prática estes sistemas”.
A maior parte das pesquisas no Nordeste do Brasil, especialmente no tocante à colheita de água de chuva para agricultura, foi feita pela EMBRAPA – Semi-Árido, a antiga CPATSA (Centro de Pesquisas Agropecuárias do Tópico Semi-Árido). Mas as experiências mesmo foram difundidas por um movimento da população rural que compreendeu as possibilidades disponíveis no clima semi-árido e que sabia como fazer as adaptações necessárias.
Plantas que captam a água da chuva, como os cactos ou o umbuzeiro, que retém a água da chuva nas raízes-batatas, são o melhor exemplo de plantas para pessoas como pode-se viver em uma região semi-árida. Seguindo o exemplo da natureza, a população rural começou a construir cisternas e implantou barragens subterrâneas em suaves declives perto dos povoados.
Raizes armazenando água do umbuzeiro
As mulheres tiveram e tem um papel importante neste processo: são elas que sempre tiveram que providenciar e manejar a água para uso doméstico. São elas que buscam água em pontos distantes ou tem que molhar a horta. Por isso elas querem e precisam ser incluídas em tudo que diz respeito à melhora no fornecimento de água. A nível local, as mulheres cuidam do manejo da água, elas são responsáveis pela sua coleta e distribuição.
Mulheres cuidando do manejo da água a nível local: construção de um caldeirão no Kenia
Hoje em dia, sindicatos e ONGs tem um papel importante na organização, na execução e no financiamento de projetos de colheita de água de chuva. Por todas as regiões semi-áridas do Brasil, estes trabalhadores e suas organizações estão tentando convencer políticos a nível local e estadual da possibilidade de um desenvolvimento sustentável para a região, fazendo desnecessário a implantação de grandes projetos de irrigação a partir de rios e águas subterrâneas.
Perspectivas para o futuro próximo (2025)
Aqui no Fórum Mundial de Água vamos lidar com as possibilidades e as necessidades de colheita de água de chuva no futuro.
A China foi um dos primeiros países a fazer estudos utilizando o método “GIS” (Sistemas de Informação Geográfica) para identificar potenciais áreas para colheita de água de chuva. Os fatores que influenciam o potencial de colheita de água de chuva observados naquele estudo forão: a quantidade de precipitação, os dias de chuva por ano, a taxa de flutuação anual da chuva e a topografia. O método “GIS” foi usado para sobrepor as diversas folhas de fatores. O resultado foi uma classificassão final de quatro diferentes áreas com demanda de colheita de água de chuva. Os resultados finais estão apresentados na figura 13:
Áreas de demanda de captação de água de chuva na China: a posição 4 (vermelho) indica as áreas de maior demanda no semi-árido do Norte e Noroeste da China
Na região semi-árida do Nordeste Brasileiro elaboramos um mapa similar com as posições relativas de demanda de colheita de água de chuva baseado em dois fatores:
O primeiro fator é a precipitação anual: a região semi-árida brasileira é localizada perto do equador, tem uma precipitação anual entre 250 e 1.000 mm e uma taxa de evaporação muito alta (evaporação de superfície aberta perto ou acima de 3.000 mm ao ano). Além disso, as chuvas ocorrem irregularmente e mau distribuídas.
Áreas de demanda de captação de água de chuva conforme precipitação anual no NE de Brasil
O segundo fator de posicionamento considera a hidro-geologia da região semi-árida. O subsolo cristalino contém nenhuma ou muito pouca água subterrânea, que muitas vezes é salgada. Por isso, esta região de subsolo cristalino, que está dentro da parte semi-árida do Nordeste Brasileiro, mas também fora dela, apresenta uma grande demanda por captação de água de chuva, para resolver o problema de água. Nas regiões com pedras calcárias, as águas subterrâneas já estão superexploradas. Existe ali em geral uma demanda média por captação de água de chuva. Nas regiões de aluvião há águas subterrâneas que podem ser exploradas com poços rasos. Nas áreas de arenito existem quantidades muito grandes de água subterrânea. Nestas duas últimas regiões a demanda por captação de água de chuva é baixa.
Áreas de demanda de captação de água de chuva conforme hidro-geologia no NE de Brasil
Áreas de demanda de captação de água de chuva conforme precipitação anual e hidro-geologia no NE de Brasil
Os potenciais da água de superfície não foram considerados neste estudo. A única fonte perene de água nesta região semi-árida é o grande Rio São Francisco. Suas águas são usadas para a irrigação de 50.000 ha de culturas, principalmente destinadas à exportação. Dentro da região semi-árida, esta área e algumas outras pequenas, são consideradas uma exceção que ocupa potencialmente 4 % do total da área.
Definir as áreas com grande demanda de colheita de água de chuva é um instrumento político eficaz. Pode ser usado para elaborar planos de desenvolvimento rural para a população local, que são economicamente viáveis, socialmente justos e ecologicamente sustentáveis.
Manejo sustentável de água em regiões semi-áridas como no Nordeste do Brasil
Conclusões:
“O manejo eficaz de recursos de água requer uma abordagem holística ligando o desenvolvimento social e econômico com a proteção dos ecossistemas naturais. Em segundo lugar, o desenvolvimento e o manejo da água deviam ser baseados em uma abordagem participativa envolvendo usuários, planejadores, e formadores de opinião em todos os níveis. Em terceiro lugar, tanto mulheres quanto homens têm um papel fundamental no fornecimento, no manejo e no uso econômico da água. O manejo integrado de recursos hídricos é baseado na percepção da água como parte integrante do ecossistema, um recurso natural e social e um bem econômico (O Banco Mundial, p. 24, 1993).”
Isso deve ser a verdade para o gerenciamento de recursos hídricos em geral. A colheita de água de chuva já preenche estes requisitos em grande parte. A cooperação global entre cientistas e profissionais ligados à colheita de água de chuva acontece o tempo todo. A bienal Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, organizada pela Associação Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva – IRCSA, proporciona um precioso fórum para uma contínua troca de idéias. Ao aprender com os erros e acertos, como também ao trocar experiências, poderemos finalmente alcançar um alto nível de sustentabilidade. A importância que a colheita de água de chuva teve no passado em algumas partes do mundo, será trazida de volta a uma vida nova nestas regiões, e irá expandir para novas regiões, onde uma população crescente exerce cada vez mais pressão para que soluções sejam encontradas para a escassez da água.

Bibliografia: · Agarwal, Anil and Sunita Narain (eds), Dying wisdom. The rise, fall and potential of India’s traditional water harvesting systems, New Delhi, 1997.
· Appan, Adhityan: Opening Address at the 9th International Rainwater Catchment Systems Conference at Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.
· José Barbosa dos Anjos et alii, Métodos de Captação de Água de Chuva “in situ”, 9a. Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.
· Cullis, Adrian and Pacey, Arnold, A Development Dialogue. Rainwater Harvesting in Turkana, London 1992.
· Fok, Yu-si, The Role of Rainwater Harvesting in the 21st Century, Proceedings of the 7th International Rainwater Catchment Systems Conference, Beijing, vol. 1, pp. 1:1-3. 1995.
· Gnadlinger, Johann, Rainwater Catchment in Brazil’s Rural Semiarid Tropics: A Grassroots’ Approach, 9a. Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.
· Gnadlinger, Johann, Apresentação Técnica de Vários Tipos de Cisternas para Comunidade Rurais no Semi-Árido Brasileiro, 9a. Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.
· Gould, John and Nissen-Peterson, Erik, Rainwater Catchment Systems for Domestic Supply. Design, Construction and Implementation, London 1999.
· Mou, Haisheng et alii, Division Study of Rainwater Utilization in China, 9a. Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.
· Neugebauer, Bernd, Der Wandel kleinbäuerlicher Landnutzung in Oxkutzcab – Yucatán, Freiburg, 1986.
· Pacey, Arnold and Cullis, Adrian, Rainwater Harvesting. The collection of Rainfall and Runoff in Rural Areas, London, 1986.
· Porto, Everaldo Rocha et alii, Captação e Aproveitamento de Água de Chuva na Produção Agrícola dos Pequenos Produtores do Semi-árido Brasileiro, 9a. Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.
· Vieira, Vicente, Água Doce no Semi-Árido, em: Rebouças, Aldo et alii, Águas Doces no Brasil, São Paulo, 1999.
· World Bank, Water Resources Management. A World Bank Policy Paper, Washington, 1993.
· Zhu, Qiang and Yuanhong, Li: Rainwater Harvesting in the Loess Plateau of Gansu, China and its Significance, 9a. Conferência Internacional de Sistemas de Captação de Água de Chuva, Petrolina, Brasil, 6 – 9 de Julho de 1999.

Dessalinização da água do mar

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Dessalinização da água do mar
 
As técnicas de dessalinização da água do mar, segundo Souza (2006),  amplamente difundidas a partir do ano de 1991 pelos países do Oriente Médio, foram vastamente utilizadas ao redor do mundo. No Brasil, o emprego da dessalinização da água ainda é pouco divulgado, sendo difundido apenas no semi-árido brasileiro. O autor ressalta que as principais técnicas de dessalinização da água são: processos térmicos (destilação Flash de Múltiplo estágio; Destilação de Múltiplo Efeito; Destilação por Compressão de Vapor; Destilação através da Energia Solar e Congelamento) e os processos através de membranas (Osmose Reversa e Eletrodiálise). De acordo com Souza (2006), nas últimas décadas, vários estudos têm sido realizados no sentido de melhorar o desempenho, segurança, viabilidade econômica das diversas técnicas de dessalinização existentes.
A técnica de dessalinização da água através da osmose inversa tem sido difundida no semi-árido brasileiro, por esta ser uma alternativa inovadora, eficaz e relativamente barata de conversão da água salgada em água potável. Porém, esta técnica tem como consequências alguns impactos ambientais resultantes do despejo de rejeitos salinos no solo e nos açudes (AMORIM,2007). Diversos autores citam formas de aproveitar estes açudes de rejeitos salinos. Amorim (2007) cita que estes açudes devem passar por um processo de evaporação solar, com finalidade de minimizar possíveis impactos ambientais. Após este processo de evaporação, são produzidos sais cristalizados que podem ser reaproveitados no setor humano, animal e industrial.
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Figura 8: Dessalinização da água do mar
Fonte: Ambiente Online

Dessalinização da água do mar

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Dessalinização da água do mar
 
As técnicas de dessalinização da água do mar, segundo Souza (2006),  amplamente difundidas a partir do ano de 1991 pelos países do Oriente Médio, foram vastamente utilizadas ao redor do mundo. No Brasil, o emprego da dessalinização da água ainda é pouco divulgado, sendo difundido apenas no semi-árido brasileiro. O autor ressalta que as principais técnicas de dessalinização da água são: processos térmicos (destilação Flash de Múltiplo estágio; Destilação de Múltiplo Efeito; Destilação por Compressão de Vapor; Destilação através da Energia Solar e Congelamento) e os processos através de membranas (Osmose Reversa e Eletrodiálise). De acordo com Souza (2006), nas últimas décadas, vários estudos têm sido realizados no sentido de melhorar o desempenho, segurança, viabilidade econômica das diversas técnicas de dessalinização existentes.
A técnica de dessalinização da água através da osmose inversa tem sido difundida no semi-árido brasileiro, por esta ser uma alternativa inovadora, eficaz e relativamente barata de conversão da água salgada em água potável. Porém, esta técnica tem como consequências alguns impactos ambientais resultantes do despejo de rejeitos salinos no solo e nos açudes (AMORIM,2007). Diversos autores citam formas de aproveitar estes açudes de rejeitos salinos. Amorim (2007) cita que estes açudes devem passar por um processo de evaporação solar, com finalidade de minimizar possíveis impactos ambientais. Após este processo de evaporação, são produzidos sais cristalizados que podem ser reaproveitados no setor humano, animal e industrial.
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Figura 8: Dessalinização da água do mar
Fonte: Ambiente Online

Captação e reuso da água da chuva

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Captação e reuso da água da chuva
 
                  Uma das tecnologias de uso sustentável da água mais difundidas na atualidade é a de captação da água da chuva. No Brasil a legislação referente ao uso das águas da chuva  ainda está sendo formulada. Podemos citar a lei municipal de Curitiba (BRASIL, 2003), lei 10.785, de setembro de 2003;  São Paulo, um decreto publicado no Diário Oficial no dia 5 de janeiro de 2002 (BRASIL, 2002).   
 Segundo Cavalcanti (2001),"na região semi-árida do nordeste brasileiro, a quantidade de chuva é de aproximadamente 700 bilhões de metros cúbicos por ano, o que torna o semi-árido nordestino diferente das demais regiões semi-áridas do mundo. A maior parte dessa chuva não é aproveitada em todo o seu potencial pois, mesmo existindo grande quantidade de barreiros e açudes, 36 bilhões de metros cúbicos se perdem pelo escoamento superficial". E importante salientar que a constante pesquisa agrícola e disseminação de informações aos agricultores é extremamente urgente e necessária para aumentar fonte de renda dos pequenos produtores, unindo com o uso racional de recursos, conservação e recuperação de habitats. O mesmo autor relata que são poucos os pequenos agricultores que têm conhecimento de tecnicas de baixo custo de uso da água, como as cisternas rurais e barreiros. Em sua pesquisa sobre implantação de barreiros em comunidades nordestinas, de 17 famílias, 8 possuem barreiros. Caso a comunidade aprenda as técnicas de construção do barreiro, seus custos não ficam elevados.

 Além da cisterna rural, existem outras técnicas de captação como barreiro para irrigação suplementar, barragem subterrânea e cisternas de captação “in situ”. Brito (1999) ressalta a importância da barragem subterrânea como aquífero artificial para a reutilização de água no meio rural. Brito (1999, p. 112) cita que estas barragens subterrâneas são definidas como “barreiras formadas por paredes que partem da camada impermeável ou rocha até uma altura acima da superfície do aluvião, de forma que na época das chuvas forma-se um pequeno lago”. O autor ressalta que esta técnica é interessante por ser de baixo custo (estas barragens podem ser feitas com argila, pedra, alvenaria ou lona plástica). Porém, na construção da barragem, alguns fatores devem ser observados como precipitação média de região, vazões dos rios/riachos, granulometria dos solos, dentre outros, sendo necessário auxilio técnico. De acordo com Laschefski (2005), a barragem subterrânea, assim como poços rasos, são importantes principalmente para o reuso da água na agricultura. A mesma autora ressalta que, além da implementação da barragem subterrânea em comunidades rurais de baixa renda, seria interessante implementar juntamente um sistema de irrigaçao de baixo custo, baseado no conceito Mandala, e métodos de agroecologia para combater à erosão do solo.
Porto et al (1995) relata sua experiência com tecnologias de captação e reuso de água da chuva no semi-árido, dando enfoque principalmente às tecnologias tais como barreiro para "irrigação de salvação", cisternas rurais, captação "in situ" e exploração de vazante. Os mesmos autores citam que a tecnologia de captação "in situ" consiste na "modificação da superfície do solo, de maneira que o terreno entre as fileiras de cultivo sirva de área de captação da água da chuva". Este sistema é de fácil construção e baixo custo. Saha et al (2007) discorre sobre sua experiência na India com reuso de água da chuva,  particularmente com a criação de pequenos reservatórios de água chamados "Jalkund".  A construção  dos "Jalkunds" além de ser de baixo custo,  pode também ser considerada de fácil implementação. Este reservatório pode ser aproveitado não somente para o cultivo, como também  para a produção de peixes e consumo nos períodos de estresse hídrico.


 De acordo com Bortoli (2004), o reuso não potável das águas pode servir para diversas atividades, tais como: agrícolas (recarga do lençol subterrâneo e irrigação de plantas alimentíceas), industriais (refrigeração, águas de processos, utilização em caldeiras), recreacionais (irrigação de plantas ornamentais, campos de esportes, parques, enchimento de lagoas ornamentais), domésticos (rega de jardins residenciais e descargas sanitárias) e aqüicultura (produção de peixes e plantas aquáticas) e recarga de aqüíferos subterrâneos. De acordo com Philippi et al (2005), a substituição da água potável por águas de chuva pode ser feita sem prejuízo a saúde caso sejam tomadas as devidas precauções (ex: utilização de filtro de areia seguido de desinfecção). 

Técnicas indígenas africanas de conservação da água

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Técnicas indígenas africanas de conservação da água
 
Segundo Reij (1991), na África, fatores como a erosão do solo, degradação da terra, desertificação, falta de planejamento e gestão dos recursos naturais e crescimento demográfico acelerado têm feito com que este continente se tornasse dependente da importação de alimentos e de colaboração de países externos para solucionar estas deficiências. A constante pesquisa que tem sido feita na África para solucionar esses problemas fez com que as técnicas indígenas de uso sustentável da água ressurgissem como forma mais simplificada e de baixo custo para conservação dos recursos hídricos.
 Segundo Reij (1991), diversas soluções para os problemas de abastecimento de água na África já foram pesquisadas, sendo que a transferência e inserção de tecnologias externas a comunidade foram totalmente fracassadas, pois tinham alto custo de implementação e ignoravam o conhecimento indígena como parte da solução. 
A importância dos saberes tradicionais como os conhecimentos indígenas africanos tem sido muito enfatizada por Santos (1989). Este autor critica o etnocentrismo imposto pelas sociedades européias e norte-americanas que acabam por desconsiderar os saberes africanos, asiáticos e sul americanos como saberes científicos. Santos (2007) também ressalta que “com a ecologia dos saberes, o pensamento pós-abissal tem por premissa a idéia da inesgotável diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade de formas de conhecimento além do conhecimento científico”. Boaventura propõe uma globalização contra-hegemônica onde os conhecimentos não-científicos e não-ocidentais possam ser valorizados. Prinz e Singh (2000) enfatizam que as técnicas indigenas africanas de conservação da água têm ganhado prestígio atualmente. Dentro da diversidade de técnicas, a escolha da prática apropriada deve ser feita de acordo com a quantidade de chuva e sua distribuição, topografia, tipo de solo além dos fatores socio-econômicos. Reij (1991) cita a variedade de técnicas tradicionais e sustentáveis de uso da terra e da água africanas, tais como: sistemas de rotação de cultivo, proteção de árvores fixadoras de nitrogênio, terraceamento, sistema Teras, construção de diques e barreiros. Essas práticas, além de terem a função de conservar o solo e água, previnem contra a erosão. O autor conceitua as técnicas indígenas africanas como “práticas de engenharia-étnica”. Reij (1991) enfatiza que o emprego de técnicas de terraceamento nas montanhas marroquinas continua a ser feito pelos agricultores locais. Dimas (2002) conceitua terraceamento como sendo a "locação e construção de estruturas no sentido transversal a declividade do terreno com objetivo de reduzir a velocidade da enxurrada e seu potencial de destruição, como também subdividir o escorrimento superficial possibilitando a infiltração da água no solo, aumentando a retenção de água" .
 
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Outra técnica importante para as comunidades do continente africano, principalmente nas comunidades rurais do Sudão, é o sistema Teras. Segundo Engelmen e Leroy (1995), esta técnica consiste em “construir barreiras de pedras ao redor da colheita para obstruir a descida e escoamento da corrente de água das montanhas, além de favorecer na recarga das águas subterrâneas, na umidade do solo e no controle da erosão. Esta tem como principal objetivo aumentar a produção agrícola das regiões áridas da Africa, não estando diretamente relacionada com o aumento da recarga hídrica”. Reij (1991) enfatiza que o sistema Teras é particularmente interessante por este ser um dos poucos exemplos de práticas de engenharias-étnicas africanas que podem ser empregadas em área bastante extensa. O mesmo autor ressalta que este sistema é bastante difundido dentro dos grupos étnicos de Kassala e Hedendwua. Kassala se encontra na região semi-desértica ao norte do Sudão, apresentando solo aluvial com poucas árvores em sua extensão. O sistema Teras essencialmente é feito para o plantio do sorgo no Sudão. 

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Nas comunidades dos Camarões, Reij (1991) discorre que 20 diferentes grupos etnicos praticam técnicas indígenas de uso sustentável da terra e água. Na região de Mafa se encontram agricultores mais bem capacitados da região, estes desenvolveram um sistema intricado de terraceamento. Para que haja um controle da fertilidade do solo, os agricultores usam adubo animal e resíduos descartados do cultivo ao longo da área de terraceamento. Além da adubação feita no terreno, há rotação de cultivares. Na região da Somália, Reij (1991) caracteriza a conservação da água local como sendo tradicional e de pequena escala. A maioria das comunidades que utilizam práticas de conservação da água na Somália estão envolvidas em sistemas agropastoris que utilizam a água para cultivo e suplemento animal. A técnica de construção de “caag” ou “gawan” tem sido empregada ao longo de diversas gerações na região. Esta consiste em construir barreiros próximos aos cultivares para formação de pequenos lagos que se abastecem com a água excedente da plantação e com a água da chuva. Este sistema é totalmente tradicional, sendo implementado pelos próprios agricultores locais que possuem poucos recursos e usam a criatividade para formulação de técnicas modestas.

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BARRAGENS SUBTERRANEAS

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Barragen subterrânea: Represamento total ou parcial do fluxo subterrâneo, transversalmente ao talvegue do vale ou às linhas de fluxo subterrâneo, nos casos de encostas. Isto se consegue através da construção de uma barreira impermeável perpendicular ao fluxo subterrâneo, obtida pela escavação de uma cava e posterior preenchimento desta por solo argiloso compactado. Para que a água não escape por baixo da barreira é necessário que esta trincheira atinja o bedrock ou substrato rochoso impermeável. Um filme de PVC, ou material de alvenaria, pode também funcionar como elemento impermeabilizante, apesar de ser mais caro.

Índice de conteúdo

Usos

  • - Como reservatório natural de água potável ou para irrigação
  • - No controle e gerenciamento de plumas poluidoras.


Vantagens das barragens subterrâneas em relação às barragens a céu aberto:

  • 1- são mais resistentes à evaporação e à contaminação por poluentes, por estarem protegidas por uma camada superior de solo.
A taxa de evaporação será inversamente proporcional à profundidade do nível estático do lençol freático. Quanto mais raso, maior a chance de a água atingir a superfície devido à capilaridade. Deve-se levar em consideração que a evaporação da água da franja capilar pode provocar a laterização e/ou a salinização do solo. O tipo de cobertura vegetal também pode influenciar o grau de perda da água armazenada no subsolo da barragem subterrânea.
Quanto à vulnerabilidade em relação à poluição, vale para as barragens subterrâneas o mesmo que está explanado em poluição de aquíferos freáticos. Só acrescentamos que, caso haja um severo acidente poluidor numa área de barragem subterrânea, os poluentes levarão mais tempo para contaminar a área a jusante, dando tempo para uma rápida intervenção reparadora.
  • 2- não sofrem assoreamento, dado que já são subterrâneas.
Os açudes e barragens superficiais ou a céu aberto, são muito suscetíveis ao assoreamento, devido ao aporte de sedimentos trazidos pelos processos erosivos. Isto não atinge as barragens subterrâneas, e o acúmulo de sedimento, quando ocorre, é muito menor. Mesmo que haja deposição de sedimentos na planície aluvial, a quantidade de água reservada não se altera muito, pois esta depende tão somente da porosidade e da permeabilidade do subsolo. Quando o subsolo natural não apresenta boa porosidade, pode-se optar por uma intervenção mais profunda, que permita trocar o subsolo por um material mais poroso. Para isto, faz-se a decapagem do terreno, retirando e guardando todo o perfil superficial de solo agrícola, que depois será usado para recompor a superfície do terreno, evitando a perda desta camada tão importante. Obviamente que isto redunda em custos maiores.
  • 3-não subtraem solo agrícola já que, com certos cuidados, estes podem continuar sendo cultivados.
Ao fazer uma represa ou açude a céu aberto estaremos cobrindo com água uma grande área de solo de várzea, um dos mais produtivos no ambiente agrícola. A represa subterrânea não provoca este dano, e o solo superficial poderá continuar sendo cultivado, até com mais vantagens, na medida que este ficará com mais umidade e permitirá melhor desenvolvimento da plantação. Se a extração da água for o principal objetivo da barragem subterrânea, o cultivo do solo superior deve evitar plantas que possuem raízes mais profundas e que extraem muita água do subsolo.
  • 4- não necessitam de grandes cálculos estruturais, mão de obra especializada e nem precisam do grau de segurança das barragens a céu aberto. Em certas situações geológicas uma simples trincheira profunda, perpendicular ao talvegue e preenchida por solo argiloso compactado pode funcionar como uma eficaz barreira ao fluxo subterrâneo. Para que a água não escape por baixo é necessário que esta cava atinja o bedrock ou substrato rochoso impermeável. Um filme de PVC pode ajudar como elemento impermeabilizante. Esta é uma estrutura que pode ser feita, em grande parte, com recursos locais e sem grande aporte de capital. Outras intervenções podem ser necessárias, como a injeção de calda de cimento ou de argila, para selar fraturas que possam funcionar como ladrão subterrâneo da água armazenada.
  • 5- em aquíferos costeiros, barragens subterrâneas podem aliviar ou afastar o perigo de intrusão salina ao dificultarem a penetração da cunha de água do mar em regiões com grande explotação de água subterrânea, onde esteja havendo um forte rebaixamento do nível freático. Uma eficiente barreira pode ser produzida pela injeção de substâncias impermeabilizantes (calda de cimento, soluções argilosas, etc) em baterias de poços profundos paralelos à linha de costa.

Desvantagens da barragem subterrânea:

  • 1- acumulam menos água do que as barragens superficiais. Para uma mesma área sob sua influência, considerando-se uma situação de ótima porosidade do terreno, elas acumulariam menos de um terço do volume de água acumulado em barragens superficiais. Por outro lado são estruturas que podem ser construídas em maior número ao longo do talvegue, multiplicando o alcance de seus benefícios e o volume de água armazenado e permitindo investimentos modulares de capital.
  • 2- como não se forma corpo de água superficial, perde-se um elemento que poderia ser utilizado na criação de peixes, possível fonte de renda para o agricultor familiar. Obviamente, nada impede que a água subterrânea acumulada seja utilizada para encher criadouros artificiais.

Outras considerações

A construção de um grande conjunto de barragens a céu aberto e subterrâneas ao longo dos cursos d'água de uma bacia de drenagem, funciona como um ótimo regularizador da vazão das nascentes e rios da bacia, impedindo enchentes, minorando os processos erosivos e impedindo o alto grau de assoreamento dos principais rios da área. Estas obras são indicadas para qualquer região, mesmo as com alta pluviometria. Qualquer projeto que vise a recuperação de uma bacia de drenagem, como a do Rio São Francisco, estará incompleto se não prever um calendário e metas para estes tipos de obra. Deve-se salientar que as barragens a céu aberto, após sofrerem assoreamento, ainda prestarão algum serviço, agora transformadas em barragens subterrâneas. A sua utilidade futura vai depender da granulometria dos sedimentos que foram depositados. Quanto mais grosseiros, melhor.
As barragens subterrâneas tem uso importante no manejo de aquíferos freáticos contaminados. Neste caso elas servem como barreira de contenção da pluma poluidora, evitando a rápida propagação dos poluentes, dando tempo para que a carga poluidora possa entrar em degradação natural (atenuação natural) ou seja removida através de bombeamento.