Carta da Terra

terça-feira, 14 de agosto de 2012

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PREÂMBULO
Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro reserva, ao mesmo tempo, grande perigo e grande esperança. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos nos juntar para gerar uma sociedade sustentável global fundada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade de vida e com as futuras gerações.
TERRA, NOSSO LAR
A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado.
A SITUAÇÃO GLOBAL
Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos eqüitativamente e a diferença entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causas de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.
DESAFIOS FUTUROS
A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais em nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem supridas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais e não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir nossos impactos no meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos podemos forjar soluções inclusivas.
RESPONSABILIDADE UNIVERSAL
Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com a comunidade terrestre como um todo, bem como com nossas comunidades locais. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um compartilha responsabilidade pelo presente e pelo futuro bem-estar da família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida e com humildade em relação ao lugar que o ser humano ocupa na natureza.
Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, interdependentes, visando a um modo de vida sustentável como padrão comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais será dirigida e avaliada.

CARTA DA TERRA

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..............................................................................................                         O CAMINHO ADIANTE
Como nunca antes na História, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Tal renovação é a promessa destes princípios da Carta da Terra. Para cumprir esta promessa, temos que nos comprometer a adotar e promover os valores e objetivos da Carta.
Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável nos níveis local, nacional, regional e global. Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão. Devemos aprofundar e expandir o diálogo global que gerou a Carta da Terra, porque temos muito que aprender a partir da busca conjunta em andamento por verdade e sabedoria.
A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto pode significar escolhas difíceis. Entretanto, necessitamos encontrar caminhos para harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, família, organização e comunidade tem um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não-governamentais e os governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva.
Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra com um instrumento internacionalmente legalizado e contratual sobre o ambiente e o desenvolvimento.
Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação dos esforços pela justiça e pela paz e a alegre celebração da vida.

CRESCIMENTO POPULACIONAL E OS DESFIOS AMBIENTAIS

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Carlos Gabaglia Penna *Dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam um quadro preocupante da população brasileira. Na publicação Brasil em números de 2001, o IBGE fazia projeções sobre o crescimento da população até 2020. Se considerarmos, por exemplo, o ano de 2003, a taxa de aumento demográfico projetada, em relação a 2002, era de 1,28%. Na edição de 2003 da mesma publicação, a taxa considerada e o montante populacional eram os mesmos. No entanto, no Brasil em números de 2006, a taxa apresentada pelo IBGE – que revela o crescimento real e não mais o projetado – é de 1,47% entre os anos citados. Isso representou 2,11 milhões de pessoas a mais do que o previsto nas edições anteriores.
De acordo com as projeções da revisão do IBGE, somente de 2009 para 2010 é que a taxa de incremento demográfico (1,27%) será inferior a que foi inicialmente prevista para 2003 (1,28%).
O índice de expansão demográfica entre 2004 e 2005, com base na publicação de 2006 do IBGE, foi de 1,43%, cerca de 15% maior do que o previsto pela edição de 2001 (1,24%). O total de brasileiros existentes em meados de 2005, segundo a mesma edição, era de 184,18 milhões. Pelo final de 2007, somaremos mais de 190 milhões de habitantes, um aumento de quase 66 milhões em apenas 25 anos (um acréscimo 66% superior à população total argentina de 2006 e cerca de 10% mais que a francesa ou a do Reino Unido). A população do país será de 250 milhões de pessoas em 2050, representando – em um século – um crescimento de 4,7 vezes ou quase 200 milhões de indivíduos a mais desde 1950!
A população do Brasil aumenta em mais de 6.410 pessoas por dia, ou 2.340.000 por ano!! Em 4/1/07, já ultrapassávamos 187.900.000 almas. É inacreditável, mas essa realidade não parece preocupar os líderes políticos e nem mesmo a sociedade brasileira. Apenas uma pequena e pertinaz parcela trabalha para que esses índices não sejam ainda mais assustadores.
Em valores absolutos, o aumento da população brasileira só é superado por seis países do mundo, sendo apenas um do hemisfério ocidental, os EUA, cujo crescimento é ligeiramente superior ao nosso. Este fato explica-se pela grande imigração ilegal que o país sofre. Sequer é válido o argumento do tamanho do Brasil (quinto tanto em superfície como no quantum populacional), pois a densidade demográfica nacional (número de habitantes por unidade de área) é igual à do Chile e à do Peru e superior às da Bolívia, Argentina, Uruguai e Paraguai, para ficarmos apenas na América do Sul.
Para absorver um aumento desse porte, são necessários investimentos maciços em infra-estrutura (que praticamente não existem no Brasil), ou seja, em saneamento básico, manejo de resíduos sólidos urbanos (lixo), energia, habitação, transporte, hospitais, escolas, segurança etc. Tudo isso enquanto essas crianças e jovens apenas consomem, pois estão crescendo e estudando, na preparação para o mercado de trabalho. Bem, quando estão prontos (ou nem tanto...), surge o novo desafio: encontrar emprego ou qualquer atividade legal que lhes dê sustento. Em novembro passado, a taxa de desocupação (eufemismo para a falta de empregos) estava em 9,6% da força de trabalho nacional.
Os “natalistas” afirmam que seres humanos só causam impactos expressivos no ambiente natural quando possuem um padrão de vida elevado, como o dos norte-americanos. Balela! Mesmo as pessoas extremamente pobres utilizam mais recursos do planeta do que qualquer outra espécie animal. Se não for um sem-teto, terá um barraco de madeira, com telhado de zinco ou de telhas plásticas e móveis toscos. Muitos terão luz elétrica, ainda que “informalmente”, e aparelhos eletrônicos. Essas pessoas – inclusive os sem-teto - obterão água do sistema público de abastecimento, ou em algum córrego ou nascente, vestirão roupas, possuirão uma infinidade de objetos pessoais e, obviamente, alimentar-se-ão, como qualquer ser vivo.
Correspondentemente, grandes animais, como baleias ou elefantes, nutrem-se de uma massa de alimentos muitíssimas vezes maior que a dos humanos, mas – até provem contrário – não se utilizam de outros materiais para o seu bem-estar...
A questão maior é que, independente do status econômico ou de valores culturais tradicionais, todos querem consumir cada vez mais, do povo Inuit do Ártico aos bushmen do deserto africano do Kalahari, dos nativos andinos bolivianos e peruanos aos quilombolas e índios de todas as regiões do território brasileiro. Dos milionários brasileiros aos japoneses e americanos, todos querem ser ainda mais ricos. Talvez existam exceções, mas a regra é inquestionável. Essa é a realidade do incomparável impacto humano sobre o planeta. E é insustentável.
Se compararmos a lista dos 10 países mais populosos com a dos 10 mais ricos (em renda per capita), encontraremos apenas um país comum às duas: os Estados Unidos. Oito dos dez mais populosos têm renda abaixo de US$ 8.000 (cinco abaixo de US$ 3.000) e sete das dez nações mais ricas tem populações inferiores a 9 milhões de habitantes, sendo duas delas inferiores a 500 mil. Todos os 10 países mais ricos apresentam índices reduzidos de crescimento demográfico (Jared Diamond, 2005).
Sir Julian Huxley, um famoso cientista, pensador e escritor inglês, questionava, em 1950, “por que, em nome dos céus, deveria alguém supor que uma mera quantidade de organismos humanos seja uma boa coisa, independente de suas qualidades inerentes ou da qualidade de suas vidas e experiências?”. No Brasil, a quantidade de pessoas parece crescer na ordem inversa da qualidade...
* Engenheiro ambiental e membro do conselho de ONGs de conservação da natureza (FBCN, IPÊ, ISM).